Para onde olhar quando queremos pensar no futuro da tecnologia?
#democracia #justiça sócio-ambiental #lixo eletrônico #meio ambiente #mudanças climáticas #violência de gênero #violência políticaImagem: Articulação dos Povos Indígenas (Apib)
Na última semana, estivemos em Brasília, acompanhando o Acampamento Terra Livre (ATL). Essa é a maior mobilização indígena do mundo e completou 20 anos em 2024. Organizado anualmente pela Articulação dos Povos Indígenas (Apib), o ATL acontece tradicionalmente em Brasília – como forma de cobrança dos Poderes – e reúne delegações de todas as regiões do Brasil, além de receber convidados do mundo inteiro.
Neste ano, o mote do evento foi “Nosso Marco é Ancestral – Sempre Estivemos Aqui”. Ninguém tem dúvidas que os povos indígenas são um exemplo de resistência. Desde 1500 no Brasil resistem à colonização europeia. Na ditadura militar, lutaram contra projetos de apagamento de suas vidas, territórios e tradições, foram presos, torturados e mortos pelo regime. Um caso simbólico é o do povo Krenak de Minas Gerais, que recentemente recebeu o primeiro reconhecimento da Comissão da Anistia de reparação coletiva a indígenas.
No pós ditadura, mesmo depois de grande batalha política para ter seus direitos assegurados na Constituição de 1988, os povos indígenas seguem resistindo ao garimpo ilegal e assassinatos por disputas de terras. Recentemente, em março de 2024, tivemos o revoltante e simbólico caso do assassinato da liderança Nega Pataxó, morta por ruralistas que contaram com a ajuda da Polícia Militar da Bahia e, como indicam as investigações, se organizaram por grupos no WhatsApp.
As novas tecnologias já estão servindo para aumentar o genocídio dos povos indígenas. Além da organização de crimes contra indígenas nas redes sociais, a Starlink, empresa de internet por satélite de Elon Musk, é a favorita de garimpeiros ilegais que invadem territórios indígenas. E ainda temos que lembrar da mineração desenfreada de lithium, ouro e outros minérios necessários para componentes eletrônicos, extrativismo desenfreado que envenena e coloca em risco a natureza, a vida e o futuro dos povos indígenas e do mundo.
Mas, voltando ao ATL… Se já está bem nítido o potencial destruidor das tecnologias contra povos indígenas, a gente também parou pra refletir no acampamento sobre as potencialidades que visões ancestrais indígenas trazem pras tecnologias. Aliás, isso até já inspirou uma carta do nosso Oráculo Para Tecnologias Transfeministas.
Apesar de acontecer no centro da política institucional brasileira, cercado de pessoas que há décadas atuam contra os direitos dos povos indígenas, o ATL se mostra um espaço de resistência e de troca de outras perspectivas, saberes e formas de se construir a política. Construções que têm como base o diálogo e a escuta, e também o respeito à diversidade de línguas, cantos, expressões… Neste ano, o ATL foi um espaço importante organização do movimento indígena para a COP 29 e COP 30, que acontecerá no Brasil. Um dos debates, inclusive, foi voltado para pensar sobre a participação das mulheres indígenas nas cúpulas mundiais.
Já faz um tempo que aqui na Coding a gente reflete sobre a partir de que olhares queremos pensar o futuro das tecnologias, e o ATL foi um espaço importante pra relembrarmos que olhar para o futuro também é olhar para o passado. É olhar para o território, para a cultura e para o diferente. E questionar essa ideia de desenvolvimento a todo o custo que só está nos levando para um ponto de não retorno do mundo que conhecemos e que podemos viver.
Viva a sabedoria dos povos indígenas, o ATL e as potentes trocas que podemos construir!